Advanced Search

Direito à informação e acesso aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres ao longo do seu ciclo de vida


Published: 2010
Read law translated into English here: https://www.global-regulation.com/translation/portugal/8161283/direito--informao-e-acesso-aos-direitos-sexuais-e-reprodutivos-das-mulheres-ao-longo-do-seu-ciclo-de-vida.html

Subscribe to a Global-Regulation Premium Membership Today!

Key Benefits:

Subscribe Now for only USD$40 per month.

PARTIDO COMUNISTA PORTUGUÊS

Grupo Parlamentar

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 77 /XI/1ª

Pelo direito à informação e acesso aos direitos sexuais e reprodutivos pelas

mulheres ao longo do seu ciclo de vida

Portugal está dotado de um importante património legislat ivo no que concerne aos

direitos sexuais e reprodut ivos. Património que foi sendo edif icado ao longo dos anos

após o 25 de Abril de 1974 e cuja lacuna mais brutal foi vencida com a aprovação, a 8

de Março de 2007, de uma lei de despenalização da interrupção voluntária da

gravidez, corolário de uma prolongada situação de injusta e dramát ica penalização da

saúde sexual e reprodut iva de sucessivas gerações de mulheres vít imas de aborto

clandest ino.

Os direitos sexuais e reprodut ivos são parte integrante de direitos sociais do nosso

tempo, não devendo ser meros direitos formais ou apenas parcialmente cumpridos.

Antes exigem uma especial responsabilidade do poder polít ico – Assembleia da

República e Governo – nas suas esferas de competência, na garant ia do seu integral

cumprimento e implementação.

Persistem lamentáveis atrasos na implementação da educação sexual nas escolas não

obstante ter sido aprovada há 26 anos a primeira lei sobre a educação sexual.

São igualmente afectados outros segmentos de mulheres que, ao longo do seu ciclo

de vida, têm maiores dif iculdades de acesso à saúde em resultado da inexistência de

médicos de família e da falta de outros profissionais de saúde.

Destaca-se, entretanto, o paradoxo entre os fundamentos que levaram a fechar

maternidades públicas por não realizarem 1500 partos por ano, quando tal requisito

não é imposto ao funcionamento das unidades privadas, porque isso signif icaria o seu

fecho.

As unidades de saúde familiar não cumprem o object ivo de minimizar o número de

utentes sem médicos de família; persistem a falta de centros de saúde, bem como os

horários desajustados às necessidades das mulheres que necessitam de recorrer a

estes serviços.

Este quadro não nega o esforço e os exemplos posit ivos de centros de saúde e outros

serviços públicos que prestam uma importante intervenção na área da saúde sexual e

reprodut iva, antes impõe que tais exemplos se estendam a todo o território nacional.

O Part ido Comunista Português, ao assinalar o dia 8 de Março, Dia Internacional da

Mulher e o centenário da sua proclamação, destaca a importância do reforço dos

direitos sexuais e reprodut ivos da mulher ao longo da sua vida, desde a menarca,

passando pela menopausa até à velhice.

Ainda no âmbito da saúde sexual e reprodut iva, o PCP tem vindo a apresentar várias

iniciat ivas legislat ivas, garant indo não só a efect ividade da educação sexual, como a

promoção da saúde sexual e reprodut iva e a protecção da maternidade e paternidade

enquanto funções sociais, de que são exemplo:

— A despenalização da interrupção voluntária da gravidez, até às 12 semanas, a

pedido da mulher;

— O reforço dos direitos das pessoas que vivem em união de facto;

— A garant ia de acompanhamento pelo futuro pai à mulher grávida durante o parto;

— O direito de licença especial nas situações de gravidez de risco;

— O reforço das garant ias do direito à saúde reprodut iva;

— A protecção de mães e pais estudantes;

— A garant ia do acesso aos medicamentos contracept ivos de emergência;

— A adopção de recomendações para que possa ser ut ilizado em unidades

hospitalares o medicamento de uso humano Mifégyne (Pílula RU 486);

— A regulamentação das técnicas de procriação medicamente assist ida;

— A adopção de medidas de reforço da protecção da maternidade-paternidade;

— A inst ituição e regulamentação de um novo regime de prestações familiares;

— A criação de um subsídio social de maternidade-paternidade.

26 anos volvidos desde a publicação da primeira lei que consagrou o direito à

educação sexual e ao planeamento familiar, importa referir alguns dos indicadores de

saúde que sublinham a necessidade e a urgência da implementação efectiva da lei. De

acordo com o Relatório do Departamento de Doenças Infecciosas, da Unidade de

Referência e Vigilância Epidemiológica do Inst ituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo

Jorge, a 31 de Dezembro de 2008 (últ imos dados disponíveis), encontravam-se

not if icados 34 888 casos de infecção VIH / SIDA nos diferentes estádios de infecção

(para 32 491 casos em 2007).

De acordo com esse relatório, “maior número de casos not if icados (“casos

acumulados”) corresponde a infecção em indivíduos referindo consumo de drogas por

via endovenosa ou “toxicodependentes”, constituindo 42,5% (14 835 / 34 888) de

todas as not if icações, reflect indo a tendência inicial da epidemia no País. O número

de casos associados à infecção por transmissão sexual (heterossexual) representa o

segundo grupo com 40,0% dos registos e a transmissão sexual (homossexual

masculina) apresenta 12,3% dos casos; as restantes formas de transmissão

correspondem a 5,2% do total. Os casos not if icados de infecção VIH/SIDA, que

referem como forma provável de infecção a transmissão sexual (heterossexual),

apresentam uma tendência evolut iva crescente.”

Já os dados da saúde dos jovens, publicados em 2006 pela Divisão de Saúde Materna,

Infant il e dos Adolescentes da Direcção-Geral de Saúde, apesar da tendência de

diminuição da gravidez, maternidade e paternidade adolescentes, “no que respeita às

idades mais jovens, constatou-se, nos 20-24 anos, um abrandamento da expressão

dessa tendência [de decréscimo], tendo havido, inclusive, um ligeiro aumento nos

anos de 1999 e 2000; no grupo 15-19 anos, a progressão decrescente do respect ivo

valor parece esbater-se a part ir de 1996, havendo ligeira oscilação num sent ido e

noutro.”, no que à maternidade concerne.

De acordo com esse estudo, em 2002, “os pais apresentaram, regra geral, um grau de

escolaridade inferior ao das mães, em ambos os grupos etários estudados. Das mães

com menos de 20 anos, cerca de um quinto terminara, no máximo, o 1.º ciclo do

ensino básico (1,7% não sabia ler nem escrever). No mesmo grupo etário, os pais que

estavam em iguais circunstâncias representaram um quarto do total (2,1% não sabia

ler nem escrever). No que respeita ao completar da escolaridade obrigatória, no caso

das mães com idade inferior a 20 anos, menos de metade conseguira-o e, no grupo

das de 20-24 anos, cerca de 56% estava nestas circunstâncias; no caso dos pais, os

valores observados foram inferiores aos verif icados nas mães, na ordem dos 7%, em

ambos os grupos etários.”

No que se refere à condição de mães e pais perante o trabalho foram notórias

diferenças entre homens e mulheres, nos dois grupos etários. Em 2002, “verif icou-se

que, no grupo dos menores de 20 anos, 61% das mães encontrava-se no grupo “não

act iva” (apenas 29% correspondia ao item “empregada”), ao passo que, no grupo

etário acima, a situação alterava-se, estando 60% das mães na condição de

“empregada” e 32% na de “não act iva”. No caso dos homens, no grupo dos menores

de 20 anos, 77% estava “empregado”, valor que aumentava para 92% no grupo 20-24

anos; estavam na condição de “não act ivo” 18% dos pais menores de 20 anos e 5%

dos 20-24 anos.”

De acordo com a Direcção-Geral de Saúde “constata‐se que, a part ir dos 20 anos de

idade, o risco de morte materna por cada nado‐vivo aumenta rapidamente com a

idade, passando‐se de 4,8 por 100000, em grávidas de 20‐24 anos, para 180 por

100000 em grávidas com mais de 44 anos. Ou seja, uma grávida com mais de 44 anos

tem um risco de morrer cerca de 37 vezes superior ao de uma grávida de 20 a 24 anos.

O risco de morte em grávidas adolescentes (<20 anos) é de 9,9 por 100000, o dobro do

risco em grávidas de 20‐24 anos. Os resultados são prat icamente idênt icos quando se

divide o número de mortes maternas pela soma dos nados‐vivos com os

nados‐mortos, numa aproximação ao conceito de risco de morte por gravidez”

(Relatório sobre mortes maternas em Portugal 2001 – 2007, Direcção-Geral de Saúde).

Tal Relatório, aponta como conclusões que “parte das estratégias de saúde para

eliminar as mortes maternas evitáveis, deviam passar por: reforçar a rede de serviços

nos diferentes níveis de prestação, bem como a art iculação entre si e a sua

acessibilidade; assegurar que os serviços de obstetrícia dispõem de condições

logíst icas essenciais para a minimização das MM (disponibilidade de acesso rápido a

bloco cirúrgico, a produtos sanguíneos 24 horas por dia, unidade de cuidados

intensivos acoplada, apoio de internista/intensivista); intensif icar a homogeneidade

da formação em serviço para todos os profissionais; reforçar o apoio a grupos

vulneráveis e implementar a cooperação mult idisciplinar em situações de risco

conhecido ou suspeito”.

A apresentação deste projecto de resolução, nesta data, decorre não só do facto do

PCP ter ao longo de décadas a responsabilidade de diversas iniciat ivas legislat ivas

nesta área (por exemplo, a intervenção da Comissão Parlamentar da Condição

Feminina, em 1987, pela voz de Maria Alda Nogueira, que procedeu à apresentação ao

Plenário da Assembleia da República de um Relatório sobre a situação das mulheres

em Portugal, em que destacava o não cumprimento da legislação sobre educação

sexual, planeamento familiar, entre outros aspectos), e pelas justas reivindicações das

organizações de mulheres apresentadas ao longo dos anos à Assembleia da

República.

A Assembleia da República, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da

Constituição da República Portuguesa, decide recomendar ao Governo que:

1 – Garanta a implementação da Educação Sexual em todas as escolas do ensino

básico e secundário, através da formação de professores, e da garant ia dos meios

para o correcto funcionamento dos gabinetes de apoio, e núcleos de educação para a

saúde;

2 – Reforce a existência em todos os Centros de Saúde de consultas específ icas para

Jovens, criadas por lei em Março de 1976 a par do reforço dos meios materiais e

humanos por forma a garant ir a informação completa e serviços acessíveis a todos os

jovens;

3 – Crie condições para que a vacinação que protege contra vírus como o HPV

(Papilomavírus Humano seja amplamente divulgada e gratuita para todas as

mulheres;

4 – Garanta e divulgue junto das mulheres a importância dos rastreios periódicos

realizados no Serviço Nacional de Saúde (SNS), nomeadamente mamografias e

ecografias mamárias, citologias e densitometrias ósseas;

5 – Reconheça e f iscalize o acesso generalizado de todas as grávidas ao

acompanhamento médico (mínimo de 5 consultas) no SNS bem como aos exames

indispensáveis – DPN (Diagnóst ico Pré-Natal), análises ao sangue e urina, controlo da

imunidade ou inexistência de doenças que coloquem em risco a gravidez e o feto

(rubéola, toxoplasmose, síf ilis, hepat ite B, HIV/SIDA, etc.);

6 – Garanta o cumprimento do Código do Trabalho e do Regime de Contrato em

Funções Públicas quanto aos direitos de maternidade e paternidade, alargando a

dispensa não apenas para as consultas pré-natais como as dispensas para as sessões

de Preparação para o Parto pelo Método Psico-Profiláct ico, bem como o direito dos

pais trabalhadores três dispensas para acompanhamento da grávida, garant indo o

direito à remuneração integral suportada pela ent idade patronal;

7 – Adopte medidas art iculadas entre os Ministérios da Saúde e da Ciência, Tecnologia

e Ensino Superior para garant ir que as Escolas Superiores de Enfermagem (ESE)

incluam formação de Preparação para o Parto pelo Método Psico-Profiláct ico;

8 – Garanta a correcta aplicação da Lei sobre a Interrupção Voluntária da Gravidez,

quer através da supressão das carências materiais e humanas, quer através do

cumprimento de todos os procedimentos de apoio psicológico e encaminhamento

para consulta de planeamento familiar, nos dez dias posteriores à intervenção;

9 – Crie medidas urgentes para a aplicação da lei sobre Procriação Medicamente

Assist ida (PMA), aprovada em Julho de 2006; tendo em conta que os elevados custos

destes tratamentos no sector privado e as longas listas de espera no sector público

são um factor de exclusão de centenas de utentes;

10 – Garanta o adequado e regular acompanhamento médico e psicológico, no SNS

na prevenção e tratamento de situações relacionadas com a menopausa,

nomeadamente os de afrontamentos, incont inência, osteoporose, irritabilidade,

insónias, desinteresse sexual, ou doença de Alzheimer;

11 – Assegure no SNS, especialmente nas unidades primárias de saúde, a existência de

serviços de geriatria, correspondendo a necessidades específ icas das mulheres nesta

fase da sua vida.

Assembleia da República, 8 de Março de 2010

Os Deputados,

RITA RATO; BERNARDINO SOARES; ANTÓNIO FILIPE; MIGUEL TIAGO; JOÃO

OLIVEIRA; AGOSTINHO LOPES; HONÓRIO NOVO