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PROJECTO DE RESOLUÇÃO Nº 28/XI/1ª
Recomenda ao Governo que adopte medidas urgentes que diminuam os tempos de espera para consulta e cirurgia oncológica e que melhorem a qualidade e o acesso
aos tratamentos oncológicos.
Exposição de Motivos
Em Portugal morrem, anualmente, cerca de 22.000 pessoas vítimas de cancro, tornando-o a
segunda causa de morte depois das doenças cardio e cérebro vasculares.
Já existiram mais do que um Plano Oncológico Nacional quinquenal; já existiu um Conselho
Oncológico Nacional directamente dependente do Ministro da Saúde; e existe uma
Coordenação Nacional de Doenças Oncológicas, prioritária e directamente dependente do
Alto Comissariado da Saúde.
No entanto, as taxas de morbilidade e mortalidade por neoplasias malignas,
nomeadamente por cancro da mama feminina, cancro do colo do útero e cancro do cólon
e do recto, não têm evidenciado melhorias significativas no contexto nacional.
Segundo a “Carta de Princípios de Coimbra”, subscrita em Novembro de 2008 pela
Presidente da Sociedade Portuguesa de Oncologia, pelo Colégio da Especialidade de
Oncologia Médica e pelo Colégio da Especialidade de Radioterapia, “a taxa de mortalidade
por cancro registou um aumento continuado em Portugal de acordo com os estudos
realizados sob a égide do IARC e publicados sob a sigla EUROCARE (1, 2 e 3), ao contrário do
que se observou na maioria dos países do espaço europeu em que nos inserimos. Apenas no
último destes estudos (o EUROCARE 4), publicado em 2007 no The Lancet Oncology se
observou, pela primeira vez, uma ligeira inversão destes números”.
Referem os especialistas que “o nosso país apresenta ainda resultados sofríveis no que se
refere ao tratamento de neoplasias malignas”.
E, apesar de todos os progressos no tratamento do cancro, sabemos que cerca de 50% dos
doentes continuam a não se curar da sua neoplasia e, pelo menos esses, carecem também
de cuidados especializados dirigidos ao conforto e promotores da Dignidade até ao final de
vida. Esses cuidados paliativos, um direito que assiste aos doentes oncológicos em
sofrimento, são também manifestamente insuficientes para os doentes portugueses.
Cumpre destacar três realidades que, de acordo com a “Carta de Princípios de Coimbra”,
contribuem para a situação presente, impedindo um tratamento de qualidade:
1) A falta de profissionais especialistas é apontada como um dos problemas mais
graves. Actualmente, estão em actividade apenas metade dos especialistas que seriam
necessários para fazer face ao número de doentes e prevê-se que esta carência se venha a
agravar nos próximos anos.
2) A falta de equipamentos em número adequado, quer em radioterapia, quer em
estruturas para a administração de quimioterapia, para fazer face ao estimado aumento de
incidência das doenças oncológicas, assim como às implicações que as novas tecnologias
impõem.
3) O aumento das listas de espera, sem que exista um aumento da resposta. No
primeiro semestre de 2008 houve um acréscimo de 3 mil doentes em lista de espera para
cirurgia em relação ao mesmo período de 2007, perfazendo um número total de 22 mil
doentes oncológicos em espera. Os tempos de espera para cirurgia e para início de
radioterapia excedem frequentemente os prazos clinicamente aceitáveis.
Neste sentido, impõe-se uma revisão da abordagem estratégica nacional que vise
contrariar a evolução da realidade existente. Tem, inevitavelmente, de ser adoptada uma
gestão integrada da doença oncológica que permita resultados eficazes no diagnóstico e
tratamento do cancro.
Uma organização eficaz da prestação dos cuidados de saúde oncológicos deve ser composta
por uma rede efectiva de rastreio e garantir o acesso atempado a cuidados especializados.
Assim, os resultados dos rastreios devem ser enviados, em tempo real, para as respectivas
unidades de saúde permitindo um diagnóstico precoce, decisões multidisciplinares e
encaminhamento imediato do doente. Os tempos de espera clinicamente aceitáveis
divergem conforme as diferentes patologias, mas impõe-se estabelecer prazos máximos de
espera para cirurgia e para tratamento, devendo estes prazos ser rigorosamente cumpridos.
Segundo a Circular Normativa nº 14/DSCS/DGID, de 31 de Julho de 2008, o modelo de
gestão integrada da doença visa “reorganizar a prestação de cuidados de saúde (…)”
garantindo que esta “se realize no nível adequado e com a melhor utilização de recursos,
facilitando-se, assim, o acesso dos cidadãos a cuidados de saúde altamente diferenciados,
para os quais é necessária uma concentração específica de recursos (infra-estruturas,
conhecimento, competências) e a programação dos cuidados necessários”.
É referido, ainda, que “a acção deverá centrar-se nas doenças com elevado peso
orçamental, com graves repercussões a nível social e económico, pela precocidade,
severidade e incapacidade associada, e com necessidades de melhoria da eficiência da
coordenação de cuidados e uniformização das práticas profissionais”.
Neste sentido, e através da Circular Normativa acima referida, a Direcção-Geral de Saúde
(DGS) criou os Centros de Elevada Diferenciação (CED) e os Centros de Tratamento (CT).
Os CED são “serviços hospitalares com elevada diferenciação técnica que desenvolvem
competências clínicas e de investigação com o objectivo de estruturar a abordagem do
diagnóstico e do tratamento global e integral do doente com doença crónica”. Estes centros
têm, nomeadamente, os seguintes requisitos:
- “Capacidade diferenciada de diagnóstico, de seguimento da evolução da doença crónica e
da sua gestão integral, com base na procura dos melhores resultados”;
- “Capacidade de confirmação de diagnósticos, de consultadoria/aconselhamento, de
colaboração na elaboração, adesão e divulgação das orientações de boa prática e de
implementação de medidas de resultado”;
- “Promovem a abordagem multidisciplinar apropriada”;
- “Promovem a continuidade de cuidados através da articulação entre os diferentes níveis de
cuidados de saúde”.
Já o CT “ é uma unidade diferenciada que, em articulação com o CED, desenvolve um
determinado tratamento médico ou cirúrgico de forma intensiva e qualificada”. Estes CT têm
em vista “a melhor prestação de cuidados de saúde, através da garantia da
complementaridade de cuidados e a sua necessária coordenação”, competindo-lhes:
- “Ter uma equipa multidisciplinar com dedicação de tempo integral ao CT”;
- “Estar habilitados e reconhecidos pelo respectivo CED com quem se articulam”;
- “Desenvolver actividades de forma intensiva e exclusiva, na área em que foram
reconhecidos”.
Através dos CED e dos CT, a DGS tem vindo a desenvolver trabalho nas áreas da doença
renal crónica e da obesidade mórbida. Mas, incompreensivelmente, não existe um
investimento semelhante para a Oncologia.
Aliás, de acordo com o “Relatório da Primavera 2009”, do Observatório Português dos
Sistemas de Saúde (OPSS) em Portugal ainda existe um “tempo de espera excessivo na
doença neoplásica maligna” que se traduz numa espera média de 102 dias por uma cirurgia,
contra os 14 dias internacionalmente recomendados. É, inclusivamente, realçado que
“comparativamente com os 14 dias de espera recomendados pela Canadian Society
Surgery of Oncology, os tempos de espera praticados ainda exigem uma considerável
melhoria na gestão de todo o processo”.
O Relatório do SIGIC relativo a 2008 apresentava os seguintes dados sobre a especialidade
de oncologia:
10.000 doentes com cancro foram operados fora do prazo;
233 doentes com cancro morreram sem conseguir uma cirurgia;
Nos IPO’s de Lisboa e do Porto 42% dos doentes são operados acima dos tempos
máximos recomendados;
Nos Hospitais da Universidade de Coimbra 28,2% dos doentes são operados acima
dos tempos máximos recomendados;
O Hospital Garcia de Orta tem uma média de espera de 86,5 dias;
No Hospital de São Teotónio, em Viseu, o tempo de espera é de 56 dias;
No Hospital do Barlavento Algarvio a mediana é de 126 dias.
Destes dados que aqui sumariamente se apresentam, fica patente uma desigualdade que
decorre de critérios geográficos e que constitui para nós enorme preocupação.
Ainda de acordo com este relatório do SIGIC as especialidades oncológicas com maior
tempo de espera são:
Tumores malignos mais raros e cancro da próstata - média do tempo de espera
superior a 2 meses;
Cirurgia pediátrica oncológica - em 2007 a mediana do tempo de espera era de 1
mês, em 2008, era de 4,17 meses;
Cancro do cólon e recto, do fígado, do pâncreas e do estômago;
Cumpre ainda salientar que, em 2008, 252.273 doentes não prioritários foram operados em
tempo inferior ao tempo médio de espera recomendado. Destes, cerca 39.000 doentes
foram operados em menos de 7 dias.
O próprio Coordenador do Relatório do SIGIC, Dr. Pedro Gomes, ao comentar publicamente
os dados apresentados no relatório afirmou que “se é possível haver tratamento rápido em
situações pouco graves, não é aceitável que os tempos de espera recomendados em
oncologia não sejam cumpridos. É um imperativo moral tratar primeiro os doentes mais
graves”. Mais ainda, afirmou que “nalguns casos, o tempo de espera excessivo pode fazer a
diferença entre a vida e a morte; é preciso fazer uma redefinição dos recursos, há
discrepâncias regionais importantes, a distribuição dos recursos não é a ideal para aquela
que é, hoje em dia, a procura em oncologia”.
Em Julho passado, vieram a público notícias dando conta que treze dos cinquenta e cinco
hospitais com tratamento oncológico não têm um único especialista em oncologia.
No Relatório do SIGIC relativo ao primeiro semestre de 2009, os dados relativos à cirurgia
oncológica são os seguintes:
Número de utentes inscritos: 3.613;
Mediana do tempo de espera: 27 dias;
Número de entradas em lista de espera: 22.358;
Número de doentes operados em hospitais públicos: 20.300;
Número de utentes operados em hospitais convencionados: 228;
Mediana do tempo de espera para cancro da próstata: 41 dias;
Mediana do tempo de espera para neoplasias malignas do “rim ou ureteres ou
bexiga ou uretra”: 32 dias;
A mediana do tempo de espera cirúrgica para utentes com cancro do cólon e do
recto subiu 15% e o número de operados desceu 6,3%;
Mediana do tempo de espera para “neoplasias malignas não enquadráveis em outros
agrupamentos”: 44 dias;
Na região de Lisboa e Vale do Tejo espera-se 29 dias por uma cirurgia oncológica, no
Centro 28, no Norte 25, no Alentejo 21 e no Algarve 15 dias.
Pode-se, assim, observar que, apesar das melhorias, as assimetrias regionais persistem e os
tempos de espera continuam acima dos recomendados.
Na passada Legislatura o CDS-PP apresentou na Comissão Parlamentar de Saúde quatro
requerimentos pedindo a audição da senhora Ministra da Saúde sobre os problemas da
oncologia em Portugal. Todos estes requerimentos foram rejeitados pelo Partido
Socialista.
O CDS-PP apresentou, ainda, em Março de 2008, um Projecto de Resolução recomendando
ao Governo que adoptasse de imediato uma reforma da prática da oncologia em Portugal.
Nessa iniciativa, foram apresentadas soluções e propostas concretas para uma prevenção,
diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos doentes oncológicos com qualidade e
humanidade. O Partido Socialista rejeitou a iniciativa do CDS-PP.
O CDS-PP entende que não se pode sacrificar um único doente à inércia ou disputas
ideológicas. Os dados relativos às listas de espera, aos tratamentos oncológicos, à falta de
especialistas, de equipamentos e de equipas multidisciplinares, entre tantos outros, são
demasiado preocupantes.
Relembramos que o cancro é a segunda causa de morte em Portugal.
O compromisso do CDS-PP é com os doentes oncológicos e com as suas famílias. Nesse
sentido, entendemos que, nesta Legislatura, é indispensável reapresentar esta iniciativa.
Pelo exposto, a Assembleia da República, nos termos da alínea b) do artigo 156º da
Constituição da República Portuguesa, delibera recomendar ao Governo:
1- Que tome as medidas necessárias de forma a dotar, de imediato, de um especialista em oncologia os treze hospitais que estão a fazer tratamento oncológico sem oncologistas.
2- Que adopte medidas urgentes que diminuam os tempos de espera para consulta e cirurgia oncológica e que melhorem a qualidade e o acesso aos tratamentos oncológicos, nomeadamente através de contratualização devidamente protocolada e monitorizada, com os sectores social e privado.
3- A implementação imediata dos rastreios sistemáticos dos tipos de cancro com maior incidência na população portuguesa: cancro da mama feminina, cancro do colo do útero e cancro do cólon e do recto, susceptíveis de diagnóstico precoce através de rastreios de base populacional, cobrindo todo o território nacional.
4- A criação de um Registo Oncológico Nacional eficaz, com emissão de dados em
tempo real que permitam estimar a incidência das neoplasias malignas e a sobrevivência aos 5 anos.
5- Que assegure a referenciação adequada dos doentes com neoplasias malignas.
6- Que assegure a projecção e planeamento das necessidades a médio e longo prazo,
em todo o território nacional, em matéria de recursos humanos e de equipamentos necessários na área da oncologia.
7- Que assegure equipas multidisciplinares, que possam contemplar desde a vertente da prevenção e rastreio ao tratamento curativo e paliativo em todos os hospitais com tratamento oncológico.
8- A criação de Centros de Elevada Diferenciação (CED) e de Centros de Tratamento (CT), nos termos da Circular Normativa nº 14/DSCS/DGID, de 31 de Julho de 2008, da Direcção-Geral de Saúde, para confirmação diagnóstica multidisciplinar e tratamento de neoplasias malignas.
9- A emissão, por parte da Direcção-Geral de Saúde, de normas de qualidade organizacional para os CED e CT.
10- A divulgação de normas de orientação clínica (“guidelines”) para diagnóstico e tratamento das neoplasias malignas, nomeadamente quanto aos tempos máximos de espera, por parte do Departamento da Qualidade na Saúde, criado pela Portaria nº 155/2009, de 10 de Fevereiro.
11- O aumento da formação de especialistas, em número, de Oncologia Médica,
Radioterapia e Anatomia Patológica, em conformidade com as projecções do Departamento da Qualidade na Saúde, para que seja possível garantir a qualidade dos cuidados e a sua acessibilidade.
12- O reforço da vertente de investigação clínica em Oncologia, área fundamental para a melhoria da qualidade do processo assistencial, formativo e organizativo das Instituições.
13- A emissão de um relatório anual sobre os rastreios, diagnósticos e tratamentos das neoplasias malignas a apresentar ao Parlamento.
Palácio de São Bento, 7 de Dezembro de 2009.
Os Deputados,